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1º lugar - Concurso de Poesia

 

A cidade onde apenas eu existo- Maria Sankova

(para ler, escutando F. Chopin: Nocturne)


Na cidade onde apenas eu existo

Na cidade onde a tua miséria não existe

Na cidade onde podes ser feliz, sem mim apenas

Na cidade onde eu não existo


Te deixo mamã, sozinha

Na cidade onde tu não me tens.

Te retiro as memórias vivas de mim

Te obrigo a largar-me.


Te oprimo a retirar os teus dedos maltratados dos meus

Os teus olhos soturnos dos meus

Sepulto o amor que sentes por mim

E parto para a cidade onde apenas eu existo


A tua vida vai começar da zero, mamã.

Vais originar as tuas ricas lembranças preciosas

Viver a tua juventude rara e inestimável

Vais desabafar com a tuas amigas sobre aquele de quem gostas.

Vais apaixonar-te pelo teu primeiro amor.

Vais beijar, vais rir, vais lacrimar, vais seduzir.


Vais provar todos os sentimentos um por um outra vez.


Vais vivenciar a primeira vez que te tiram a impureza

Da mesma forma crias os laços intimidantes com apenas o toque

Respiras o mesmo ar que a tua alma

Atrais a boca do teu estimado para a tua


Envolves a tua língua na dele

Enquanto a troca de sentimentos

Acontece através do deslumbrante golpe.


Olhas nos olhos de quem amas e vês apenas o futuro

Voas entre as nuvens e desfrutas das paisagens do clima de aurora

Te encantas apenas com o suspiro dele, e enlouqueces com a lubricidade.


Mas desta vez não cometas o mesmo erro mamã!

Não procures por aquele,

Aquele que te tirou a vida e te pôs no inferno!


Luta mamã, luta!

Imploro-te, desvia-te da agressão

Não te coloques nessa condição outra vez.


Foge mamã, foge mamã!

Eu sacrifico a minha vida pelo começo da tua.


Vive mamã, vive!

Vive sem as correntes ao pescoço

Que te impedem de respirar a vida

Vive sem o sofrimento do teu fim

Com a tua morte cruzada no futuro nos braços daquele homem.


Para de chorar mamã, para.

Não aguento ver-te assim,

Tratada como uma raça inferior

Que não é digna de existir


Marcada és todos os dias

No inferno vives todos os dias

Partes do teu corpo são arrancadas todos os dias

Já não vejo a tua ternura há muito tempo, mamã.

Tenho saudades. Tenho medo...


Estou farta de ouvir os teus gritos!

Os gritos que rasgam o teu corpo

Mas capazes não são de sair dele!


Deitada no chão, estavas assim...

Quando a última vez aconteceu.

Oceanos corriam dos teus olhos,

Eras levada levemente pela morte

Enquanto meu pai em cima de ti estava


A torturar-te com um inesquecível sorriso na cara.

E assim levou-te como tesouro e prémio ao triunfante.


Como se não fosses nada.

Como se fosses irrelevante à vida.

Como se a tua presença não fosse lida.


Corre mamã, corre mamã, corre mamã!

Apenas foge para o céu, onde a tua alma possa descansar sem o inferno à vista.

Apenas com a paz eterna ao teu lado.


Este meu e teu pesar apenas acaba

Quando partir para a cidade onde apenas eu existo

Estou a sacrificar a minha vida pelo começo da tua mamã!


Aprecia o sabor da tua contemporânea existência!

Existe exclusivamente para ser feliz!

Abandona-me e corre depressa para longe!


Rasgas as memorias do teu primeiro amor

Rasga as memorias do teu bebé

Rasga as memorias do teu primeiro tudo

Do teu sofrimento, desencanto e lacrimejo


Parte as correntes que correm nas tuas veias e te sufocam no pescoço

Encontra a chave para abrir a porta da cidade onde eu não existo

E cria a existência de uma nova vida, sem mim apenas.


Amo-te mamã! Mas peço-te...

Morre em paz na vida que tinhas

Concebe a vida que te dei e canta,

Canta apenas uma última vez a nossa canção de embalar

Porque estou a caminho da cidade onde apenas eu existo.

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